01.

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CAPÍTULO 01.
os livros da biblioteca.

         ARABELLA ACORDOU RADIANTE naquele dia. Estava ansiosa para reencontrar todos os seus amigos da faculdade e vasculhar a biblioteca à procura dos livros novos que com certeza já teriam chegado.

Afonso Gomez, o senhorzinho de sessenta e sete anos, cabelos brancos como a neve, de altura baixa pela coluna envergada e que tomava conta da sala durante todo o ano acadêmico, era um grande amigo da garota. Na biblioteca, conversavam sobre a vida — e seus derivados — durante horas e horas, e quando o tempo livre de Arabella estava se esgotando, ela arrastava todos os ponteiros do relógio para trás, para que assim, pudessem continuar refletindo em torno de assuntos aleatórios por muito mais tempo.

Como na vez em que fingiu limpar uma prateleira inteira de livros apenas para aproveitar a companhia do velho. Era um dia chuvoso e muito alunos haviam faltado, incluindo todos os seus limitados amigos. Fez da biblioteca sua válvula de escape, indo pra lá sempre que precisava de conselhos, ou até mesmo apenas alguns segundos de muita paranóia.

Arabella gostava de como Gomez pensava, ele tinha uma mente aberta e cheia de ideias brilhantes, era de fato um avô. Substituindo o lugar daquele que nunca foi presente; Roger Peralta.

Estava ansiosa para revê-lo.

— Ô, ARABELLA! É PRA ONTEM! - Uma voz feminina gritou do lado de fora, batendo repetidas vezes na porta da casa dos Peraltiago. — TÁ ACHANDO QUE EU TENHO O DIA TODO, É?

— ESPERA! - ela respondeu, segurando uma feialavra, que é como chama os palavrões quando está na companhia do irmão mais novo. Deu um beijo em Mac, que assistia um desenho na TV enquanto desfrutava do conforto do sofá, e se despediu do pai que lavava a louça do café da manhã, saíndo para fora.

Amy já não estava mais ali, havia ido mais cedo pro trabalho por complicações num antigo aprisionamento, portanto, não pôde acompanhar a filha durante seu primeiro trajeto do ano para a faculdade.

— Nasceu de sete meses? - Arabella resmungou assim que encontrou Lacey Jeffords, sentada no meio-fio, com os cotovelos apoiados nos joelhos. — Até parece que não consegue esperar mais de dois minutos.

— DOIS MINUTOS? - ela sibilou, franzindo a sobrancelha em exagero. — Eu tô te esperando aqui igual os fãs da Lady Gaga naquele show que ela cancelou, faz, trinta. E. Dois. Minutos.

— Que exagero! Foram só sete - Santiago revirou os olhos. — Cadê o Nick?

— Ele não vem mais. - Lacey explicou ao se levantar, batendo na calça que usava para espantar a poeira da calçada. Retirou um molho de chaves do bolso traseiro e girou nos dedos, arrancando olhares desacreditados da amiga. — O Charles disse que queria levar ele, por ser o primeiro dia e tal. Coisa dos Boyle, você sabe.

— Você pegou o carro escondido, não foi? - a de cabelos lisos tombou o pescoço pro lado, estreitando os olhos. — Você não tem licença pra dirigir, Ceci, o Terry jamais te daria as chaves.

Ela observou o Citroën C3, verde musgo, estacionado ali. Tinha um amassado pequeno na porta traseira, e um esfolado no para-choque dianteiro, parecia recente.

— Entrar nesse carro é suicídio! Você é pior do que aquela loira, vidente, do livro que eu li, dirigindo.

Arabella tinha um certo problema em infringir leis e burlar regras. Não estava nem um pouco errada nesse quesito, afinal, documentos e regimentos foram criados para serem seguidos. Tinha obviamente herdado a paixão pela burocracia de sua mãe, Amy.

Mesmo que nos Estados Unidos a carteira de motorista não seja um monstro de três cabeças, a Santiago priorizava isso. Lacey tinha noção básica de como manusear um volante, mas claramente não era uma das melhores motoristas da cidade, afinal, reprovara no teste quatro vezes.

Na primeira vez, bateu a lateral do carro no muro, arrancando o retrovisor. Na segunda, estava nervosa demais por achar que cometeria o mesmo erro novamente. Desmaiou no volante em plenos 20km/h.

Na terceira e na quarta, teve um apagão de memória. Não acertou a maioria das questões na prova teórica.

— Você não quer se atrasar no primeiro dia, quer? - Jeffords provocou, já no banco do motorista. Deu partida no carro e se preparou para partir sem a mais nova, claramente blefando. — Podem questionar o seu método, mas nunca o seu resultado.

Arabella se odiou muito naquele momento. Sabia que estava sendo manipulada, no entanto, não continuou a questionar, e quando menos percebeu, estava sentada no acento do passageiro, assistindo outros diversos veículos ficarem para trás pela alta velocidade.

— Devagar, Ceci. Eu ainda sou muito jovem pra morrer - alertou, quando sentiu os socos dos quebra-molas ficarem cada vez mais secos. — Nem fui num show da Taylor Swift. Ainda.

A outra assentiu, diminuindo a velocidade. Não fazia por mal, mas tinha o pé no acelerador antes mesmo de acelerar. Era de fato, impulsiva.

— Chamei o Jonas pra sair. - Lacey disparou de repente, como se fosse passar despercebido pela recente reclamação.

— O QUE? - Arabella exclamou, esbugalhando os olhos; assustando a cacheada que golpeou o volante pro lado de maneira tão ríspida fazendo o pneu do carro cantar. — AQUELE ESQUISITÃO SEM GRAÇA QUE QUER SER BOMBEIRO? - levou as mãos até a fonte, massageando com os olhos fechados, recebendo uma carrancuda em resposta — Com tanta gente pra você escolher... tinha que ser logo o Jonas cara de mirtilo?! Eu até deixava você tentar alguma coisa com a Tory, mas com o Jonas... Decaiu mesmo hein, Lacey? Carambolas, catapimbas, caçarolas...

— O pai dele é instrutor.

— TÁ QUERENDO PEGAR O PAI D...

— NÃO, ARABELLA. - ela pisou no freio, levando as duas para frente num ato brusco, mesmo que estivessem usando cinto de segurança. — Tô dizendo que o pai dele é instrutor de auto-escola... eu já reprovei quatro vezes... uma ajuda não faria nada mal. - deu uma piscadela.

Santiago finalmente compreendeu, se tranquilizando.

Não que Jonas fosse um cara ruim e cruel, é claro que não. Mas tinha cabelos escuros, assim como mais da metade dos estudantes da Universidade, usava calças jeans coladas demais, e afirmava ter um peitoral de invejar.

Era um completo metido, se igualando a todos os outros companheiros de seu bloco; O bloco dos bombeiros.

— Interesseira - Bella sibilou, negando com a cabeça. — Tudo bem, eu te perdôo. Ainda é melhor que ser namorada de um bombeiro.

Lacey suspirou, dando continuidade ao trajeto para a faculdade. Atravessaram alguns bairros em silêncio e concentração, até que ela não se contentou em ficar calada.

— Cagney me contou sobre o garoto do café - começou, atraindo o olhar da mais nova. — Disse que ele apareceu ontem de novo, ainda discutindo no telefone. Perguntou de você. Falou que queria te devolver o dinheiro que gastou com o lanche.

Arabella ficou em silêncio.

— Ele discutiu com a Tory - Santiago se preparou para disparar em perguntas mas foi interrompida. — Ela não quis aceitar a grana super alta que ele deixou no balcão, pra te provocar caso você aparecesse. Aí ele insistiu demais, e como a Victoria não é uma senhora paciência eles discutiram no balcão do café.

— Que idiota - respondeu, se controlando para não dizer poucas e boas. Não queria deixar tão explícito a raiva absurda que sentia por mexerem com sua amiga, Victoria.

E nesse clima, elas seguiram sem mais controvérsias surpresas para o destino.

Logo que chegaram, Lacey deixou Arabella, indo rumo a diretoria para encontrar a irmã gêmea que provavelmente se envolvia com as papeladas da matrícula.

Santiago se viu sozinha nas escadas, não sabendo se primeiro procurava Nikolaj ou corria pelos corredores e degraus acima, na direção da biblioteca.

Estava movimentado por ali. Diversas pessoas andavam depressa pelo local, enquanto tinham em mãos apostilas e livros, seguido de uma mochila nas costas. Exceto Enigma, sentada num dos bancos da entrada, ela não carregava nada além do celular de última geração.

Haviam quatro garotos à sua esquerda, e duas garotas à direita. Lhe abanavam pelo calor — não — escaldante, pediam fotos e autógrafos, e agiam como marionetes, fazendo tudo que ela pedia.

Jesus Cristo. Arabella resmungou nos pensamentos, observando a cena.

Grande parte da adoração que Enigma recebia vinha da profissão de sua mãe, Gina. Depois que pediu demissão do antigo emprego como secretária na 99, seguiu a carreira de influencer, o que, consequentemente, fez dela uma verdadeira estrela. E filha de estrela, estrela é. Enigma podia se considerar uma nepobaby.

Bom dia, Bella! Quase te confundi com um pinheiro, tá parada aí faz cinco horas! - Nikolaj se aproximou, limpando a lente dos óculos na barra da camisa social azul que usava. — O que vai fazer agora?

— Procurar o horário das minhas aulas e estudar - ela deu de ombros e ele demonstrou não concordar.

— Mas é o primeiro dia! Ninguém estuda no primeiro dia!

— Eu estudo! - Nick se deu por vencido sem muita insistência e Arabella se sentiu incomodada por isso. Não era como se ela precisasse se esforçar muito para ter o apoio do rapaz, no fim, ele sempre cedia aos seus comandos.

Na maioria das vezes Nikolaj agia como se não tivesse opinião própria, e aquilo a irritava profundamente. Ele não fazia por mal, mas tentava ser bom demais, e esse era o problema.

— Beleza. O que você quer fazer? - ela respirou fundo.

— Achei que você quisesse estudar...

— O que você quer fazer, Niko? - deu ênfase.

— Falar com os calouros!

— Então vai! Te encontro, em algum lugar, daqui a pouco.

— Não, eu não posso te deixar sozinha.

— Se você não for eu vou ficar muito triste. Triste pra valer! - ela o ameaçou e ele esbugalhou os olhos, saindo para o pátio de fora mesmo que um pouco relutante.

Santiago seguiu para a sala de direção, onde conseguiria todos os planejamentos de aulas e horários para que pudesse se organizar melhor.

Olhou para o papel que lhe foi entregado em mãos após alguns segundos e franziu as sobrancelhas ao ler algo diferente do ano passado.

— Com licença, - a mulher de óculos grandes, cabelos ruivos e curtos, nariz sardento e empinado, do outro lado do balcão, levantou o olhar baixo sobre Arabella. Ela se arrepiou. — Aqui nas atividades extracurriculares diz "campo vazio" - a secretária assentiu, fazendo pouco caso. — Mas eu sou do clube de debate! Está errado. Não está vazio.

— Clube de debate não conta como atividade extracurricular esse ano - ela respondeu de forma lenta, entregando outra folha de papel. — Recomendo que faça um esporte de verdade. Um que esteja nessa lista.

Arabella pegou a lista, lendo todos os tópicos rapidamente, tal qual um furacão.

Futebol, voleibol, handebol, basquete, xadrez e teatro, estavam grifados em cores diferentes.

— Quero xadrez. - ela devolveu o papel.

— Está grifado em vermelho - a ruiva, que Bella notou se chamar Rosana pelo crachá preso no casaco, empurrou a folha novamente. — Está lotado.

Santiago travou. Esportes não eram nem de longe o seu forte. Ficava sem ar até ao subir apenas dez degraus de escada, quem dirá correndo por vários minutos seguidos atrás de uma bola.

O clube de teatro era a melhor das hipóteses, e mesmo assim, ela não tinha vontade alguma de participar. É péssima atuando, e pior ainda, em se apresentar na frente de dezenas de pessoas.

Não que seja introvertida ou algo assim, no entanto, não é nenhuma miss simpatia.

— Eu posso trocar? - perguntou após alguns segundos em silêncio. — Se eu mudar de ideia? - Rosana assentiu. — Então escolho handebol.

— Está lotado.

— Mas tá grifado em azul! - ela franziu as sobrancelhas, vendo a mulher revirar os olhos.

— Você não vai durar um dia nesse esporte, e eu sou muito ocupada pra ter que te fazer outra ficha quando decidir trocar.

Arabella estreitou os olhos, irritada. Odiava quando duvidavam de sua capacidade.

— Quero que me inscreva no handebol - competitiva como era, ela insistiu. Prometeu a si mesma que venceria o primeiro jogo do time custe o que custasse e que esfregaria o troféu, ou o que quer que ganhassem na competição, na cara de Rosana.

Sorriu em altivez quando teve uma nova folha em mãos, dessa vez, sem o "campo vazio" marcado em preto.

⋆      ⋆      ⋆

FECHADO    EM    PUNIÇÃO!
repudiamos todo e qualquer
ato de rebeldia ou vandalismo.

Arabella quase caiu para trás ao ler o aviso colado na enorme porta de vidro da biblioteca. Esteve em choque pelos próximos oito minutos até que um zelador desconhecido se aproximou, a tocando no ombro para desperta-la.

Ele tinha cabelos encaracolados e era mais branco que uma pasta de dente. O enorme bigode abaixo de seu nariz não passava despercebido, assim como os braços e as pernas super finos.

— Tudo bem, garota? - ela negou, com a boca entreaberta. — O que aconteceu? - ela apontou para o cartaz, com o dedo indicador.

— Ah sim! - o homem riu. — Fecharam há pouco tempo. Alguém estava arrancando páginas dos livros e levando embora.

— Quem?

— Ninguém sabe. As câmeras não estavam ligadas, e não deixaram rastros - ele respondeu, voltando aos seus afazeres com a vassoura. — Parece até coisa de filme.

— Mas e o Afonso? - ela grudou o nariz no vidro, tentando enxergar o velho do outro lado.

— Sem biblioteca, sem emprego - e então, o homem de bigodes se afastou, sumindo no corredor.

Arabella permaneceu ali, esperando finalmente acordar. Não aprenderia as regras do handebol sem os livros.

Tem a internet, é claro. Mas para ela, nada se compara ao ensinamento dos livros.

Também não teria mais os conselhos do sábio Afonso, o que piorava tudo.

As esperanças estavam quase no fim quando olhou para o duto de ar, logo acima da porta, no canto direito. O corredor continuava vazio, e era ocupado somente por si e seus pensamentos cada vez mais mirabolantes.

Era uma oportunidade de ouro. Sem câmeras, sem pessoas. Entrar, pegar o livro, sair. Nada podia dar errado.

Decidiu que faria aquilo mais tarde, na companhia de Nikolaj, pois não alcançava o duto sozinha.

Ao soar do sinal, se moveu para a sala de aula, nunca deixando de pensar em esquemas para que não fosse descoberta na execução de seu plano maluco.

— Nunca achei que você fosse se atrasar pra aula no primeiro dia - Cagney apontou com a cabeça para o Sr. Matthew, o professor de cara nada boa, ao ter Arabella sentando na fileira ao lado. — Ele não tá de bom humor.

— Ele nunca tá de bom humor - Nikolaj acrescentou, sentado na cadeira logo atrás a da mesa da Jeffords.

Esse era o único horário em que estudavam juntos. Matemática, a única materia que tinham em comum. Depois disso, só se viam no almoço quando se reuniam com as outras; Lacey, e as vezes Enigma, caso não estivesse ocupada demais com a fama.

— Conheceu muitos calouros, Nick? - ela perguntou, pondo os pés pra fora do limite da carteira, e retirando alguns materiais da mochila, pondo os em sua mesa.

— Não falei com nenhum na verdade. Encontrei o Lorenzo no caminho e ele não parou de falar.

— O Lorenzo neto do Scully? - Cagney perguntou, se virando para trás. Nikolaj assentiu. — O que ele tava fazendo aqui? Que eu saiba ele não tem nenhum interesse em faculdade.

— Ele trabalha como jardineiro - o de óculos justificou. — Contrataram ele e mais um pessoal. Disse que já são de casa, porque já chamaram eles sete vezes pra cortarem a grama daqui.

— Achei que ele fosse padeiro. - Arabella franziu o cenho, e Cagney respondeu.

— Ele era! Antes de ser mecânico, pelo menos.

— Silêncio, pessoal. Sem mais conversas paralelas! Acredito que todos os atrasadinhos já tenham chegado, então vamos ao que interessa - ele se virou para o quadro, começando as anotações. — Recapitulando alguns assuntos já comentados, álgebra linear - Santiago resmungou disfarçadamente. Amava estudar, amava mesmo, no entanto, quando algo envolvia matemática, sentia um sufoco tão grande que era capaz de sentir o ar se esvaindo de ambos os pulmões. — Hoje vamos realizar apenas algumas matrizes... - ele parou de falar assim que a porta se abriu.

Um garoto loiro invadiu a sala, parando bruscamente de andar assim que percebeu todos os olhares caírem sobre si. Arabella e Cagney o reconheceram de imediato, era aquele o garoto da cafeteria. O qual não sabiam o nome, mas sabiam que tinha dinheiro de sobra e um pai nada presente.

Ela se questionou o porquê dele estar estudando ali. Long Island era de fato um estabelecimento ótimo de ensino, mas não era a melhor do Brooklyn.

— Parece que temos mais um atrasado por aqui - o Sr. Matthew começou, claramente irritado pela interrupção. — É seu dia de sorte, garoto. Apresente-se.

O ritual de "Boas-vindas" era como ele chamava a situação constrangedora em que colocava os alunos que chegavam atrasados demais. Os deixava no meio da sala, exigindo uma apresentação completa. Nome, idade, hobbies, e música favorita.

Ele realmente não se importava com as respostas, apenas na vergonha que o fazia sentirem.

Arabella felizmente nunca passou por isso. Por nunca ter cometido atrasos era sempre a primeira a chegar em sala de aula. Imaginou que o temido dia fosse chegar hoje, quando demorou alguns minutos a mais para aparecer, mas Matthew pareceu não se importar.

Talvez ela fosse mesmo a aluna favorita dele, como costumava pensar.

— Vamos lá, comece - o loiro foi puxado gentilmente para o centro da lousa. — Você só tem que dizer seu nome, o que gosta de fazer, e sua música preferida. Ande.

— Luke Pembroke - ele disse, e de repente, o mundo se tornou quieto. Arabella, Nikolaj e Cagney se entreolharam, sibilando em silêncio uma única palavra.

"Abutre."

— Jogar baseball, fotografar e dirigir?! - o garoto deu de ombros, como se não soubesse o que mais responder. — Não sei. Heartless, do Kanye West, eu acho.

Houve um burburinho de reprovação ao gosto musical, e gritos espalhafatosos de folia, tudo para que ele se sentisse ainda mais constrangido. Por outro lado, ele não pareceu se envergonhar, continuando com o ar de soberania.

Santiago se afundou vagarosamente na cadeira em que sentava, tapando o rosto com a apostila, na esperança de passar despercebida pelo garoto que provavelmente a afogaria numa piscina de café se a visse.

— Vá se sentar - Matthew mandou, e ele obedeceu, passando os olhos por toda a sala à procura de um lugar para se acomodar pelo resto do semestre.

Pegou a primeira carteira da fileira do meio, ficando frente à frente ao professor. Já que o espaço no fundo não parecia muito amigável por ter um grupo de góticos ao redor, optou pela menos pior das opções; Encarar Matthew careca, o dia todo.

— Agora, para que não tenhamos mais interrupções... A lista! - ele levantou a pasta verde nas mãos, se sentando na cadeira.

Arabella conhecia bem aquele papel.

Era onde ficavam todos os nomes completos dos alunos. Sr. Matthew lia todos em alto em bom som para se certificar de que todos os alunos estavam em sala. Anotando os faltosos e levando para direção quando preciso.

Como o esperado, ela era a primeira na lista.

— Arabella Holly Peralta Santiago - ele chamou.

Ela, por livre e espontânea pressão de Cagney, que, sem sucesso na discrição, puxava a apostila de sua mão — tirou o livro do rosto, ajeitando a postura na cadeira novamente, e levantando a mão.

"Aqui. Senhor."

Os murmúrios de deboche pela sala não passaram despercebidos. Resmungando baixinho pela composição exótica do nome, Luke foi um dos que riu anasalado, coçando a ponta do nariz, para disfarçar. Arabella, do fundo da sala, o fuzilou com os olhos.

Se já não simpatizava com eles antes, por ter sido arrogante no café, ter discutido com sua amiga, Victoria, e por ser filho do maior rival de seus pais, Abutre, agora, que caçoou de seu "conjunto de letras", certamente, a simpatia não reinaria entre os dois.

⋆      ⋆      ⋆

        Arabella, descansando do almoço na sombra de uma árvore, aproveitava a companhia de seus dois amigos, Cagney e Nikolaj, enquanto observava Lacey arremessar bolas na cesta, numa quadra aberta, tendo do outro lado da grade hexagonal, a vista completa de Lorenzo, aparando a grama com outros dois funcionários.

Lacey sempre fez parte dos times de basquete. Na creche, no fundamental, no ensino médio, e na faculdade, lá estava ela, implorando por qualquer vaga livre no esporte.

No momento, estava em seu penúltimo ano como cursante de educação física. Se tornaria uma líder das boas, e sairia pelo mundo espalhando seus trejeitos e habilidades como possível técnica de um time oficial.

Cagney, por outro lado, cursava medicina veterinária. Seu maior sonho era verificar bodes. Ela não sabe ao certo o porquê, mas sente que não vai ter seu propósito de vida cumprido até medicar um deles.

— Enigma na área! - a filha de Gina se aproximou, se juntando à sombra das folhas. — De acordo com minhas fontes tem carne podre no pedaço.

— Cansou da fama, Iggy? Se sentando aqui, com os esquisitos... - Nikolaj perguntou, recebendo uma cotovelada de Arabella que o repreendeu por chamar a dupla e a si próprio de esquisito. Ele resmungou.

— Tá falando do filho do Abutre? - Cagney estreitou os olhos, tentando enxergar o rapaz sentado sozinho no banco, à alguns metros dali. Luke usava o telefone, mas não parecia irritado dessa vez, e nem estava em ligação. — Ele parece solitário.

— Não está. O ego dele vale por cinco. - Arabella respirou fundo, ansiosa para mudar de assunto. — Entrei no time de handebol.

Um silêncio ensurdecedor se instalou. O peso de três pares de olhos a encarando sem piscar ela sentiu.

— Vão te amassar em campo. Tipo. Pisotear. Mesmo. - Enigma sibilou.

— Era isso ou uma atividade extracurricular em branco. Eu não tive escolha.

— Pobre Arabella... - ela imitou um olhar penoso, levando a mão num ato caritativo ao coração. — Eu deixo minha foto do instagram em preto por dois minutos, em luto e solidariedade, por você.

Arabella fez cara feia, mostrando a língua. Mas logo se permitiu rir.

— Preciso dos livros da biblioteca.

— ESTÁ FECHADA! - Lacey gritou da quadra, arremessando a bola na direção do grupo. Acertou Enigma, que estapeou antes que a atingisse na cara, e segundos depois, Nikolaj, que caiu para trás após ser atingindo, procurando os óculos perdidos na grama. — DOUBLE KILL!

— LACEY! Não faça mais isso! O Nick quase não enxerga, quer deixar ele cego de vez?! - Cagney advertiu a irmã. — Espera - ela parou bruscamente, levando os olhos esbugalhados até Arabella que sorria inocentemente. — Você não tá pensando em invadir, não é?

Santiago deu de ombros.

— Não é como se eu estivesse traficando substâncias ilícitas, Cags. São só alguns livros.

— Posso gravar pro meu Close Friends? - assim que Enigma perguntou, um coro de "NÃO" se fez presente. — Tá. Já entendi.

— Eu vou com o Niko. Muita gente no mesmo corredor pode levantar suspeitas. - Nikolaj a encarou. Surpreso pela escolha já que ele não tinha intenção alguma em fazer parte daquilo. — Anda, Niko.

Sem mais interrupções, os dois se levantaram.

Correram da forma mais discreta que conseguiram, ou seja, não foram nada discretos. Alunos de todos os blocos os direcionavam olhares soberbos, analisando-os dos pés a cabeça, como se estivessem prestes à vomitar ali mesmo.

Arabella gostaria de pergunta-los qual era o problema, mas era puxada por Boyle antes de qualquer iniciativa.

— Como é que você pretende entrar lá? - ele espiou o último corredor, para ter certeza de que não tinham sido seguidos ou coisa do tipo. — Vai chutar a porta e quebrar o vidro?

— Claro que não. Vou entrar pelo duto - ela apontou para a abertura de metal logo acima da porta. — Ainda, Nick, faz pezinho!

Ele não questionou.

Cruzou os dedos, selando as mãos firmemente, e se baixou para que Arabella pudesse subir. Ela o entregou o celular que tinha no bolso, avançando para o cubículo.

Era apertado, sem dúvidas, mas a garota cabia. Se espremeu o máximo que pôde, encaixando da cintura até a cabeça dentro do quadrado.

— Seu celular tá tocando! - Nikolaj avisou, mas não era como se ela conseguisse virar a cabeça para ver do que se tratava. Apenas resmungou algo como "foque nos corredores e não no meu celular" e voltou a se rastejar pelo duto.

Apenas as suas canelas estavam para fora agora.

— Arabella - Boyle a chamou, sussurrando. — Desce daí. Agora.

— JOGAR O ALFACE FORA? - ela gritou, ecoando um som abafado. As paredes metálicas encontravam-se interferindo na audição.

Nikolaj se desesperou. Ao aparelho tecnológico de Arabella, que só desbloqueou por saber a senha de cor, "131289", ele conversava com Enigma. Ou quase isso.

— ELA NÃO RESPONDE! - berrou.

— Bonde? - Santiago se afundou ainda mais no duto. Agora, desaparecendo por completo. — Fala português, alienígena!

Nikolaj não tinha ideia do que fazer. Estava desperado. Prestes a se ajoelhar no chão e pedir perdão por todos os pecados cometidos. Se os diretores soubessem de sua mal planejada aventura, eles estariam ferrados. Fritos no azeite. Expulsos!

Por ser oito centímetros mais alto que Arabella, alcançava os dutos sem muito esforço. Se pôs na ponta dos pés, esticando os braços dentro do túnel da melhor e maior forma que conseguiu.

Agarrou os pés dela, a puxando para trás. Arabella resmungou alguns palavrões em protesto, recuperando o fôlego quando sentiu o chão novamente.

Antes que pudesse repreender Nikolaj pelo ato bruto e não avisado, ouviu sons de passo atrás de si. Se virou inocentemente, dando de cara com quem menos queria ver.

— Você não me parecia alguém que destruiria os livros de uma biblioteca - Luke franziu o cenho, caminhando na direção dos dois enquanto segurava uma câmera digital. Estava cursando fotografia.

— Não fomos nós que fizemos isso. - Arabella respondeu, como se fosse óbvio.

— Eu realmente gostaria de acreditar em você, mas, sabe como é! Aluno novo... notas medianas... uma oportunidade de ouro nas mãos, e de repente, o favorito dos diretores. - ele jogou a câmera de uma mão pra outra. — Está gravado! É a prova do crime.

— Beleza! - A Peralta fingiu não se importar, empurrando Nikolaj aos poucos para trás. O garoto de óculos percebeu o que ela iria fazer no exato momento em que colocou a língua entre os dentes, sorrindo fraco, como se não fosse nada demais.

Arabella fazia aquilo sempre que se sentia pronta para degolar alguém. Não acontecia com muita frequência, embora. Talvez duas vezes por semana, com os correios que entregavam suas xícaras coloridas compradas pelas internet quebradas, fazendo-a ter o trabalho de trocar todas as vezes por um produto novo.

Nick interviu, entrando na frente dela antes que as coisas saíssem do controle. Como já haviam saído há alguns minutos.

Ele arregaçou as mangas de sua camisa azul, como alguém se preparando para uma briga.

— Não, Niko - Santiago o tocou os ombros. — Sou só eu invadindo a biblioteca, não tem como você se encrencar com o vídeo. Fazendo isso você vai ser expulso também. Encontre o trio, e diga a elas que eu as amo - em seus olhos brotaram marés — Posso lidar com ele sozinha. Vá. Siga seu caminho! - ela estreitou os olhos de forma impaciente, vendo que o amigo não a obedecia. Por fim, Nikolaj entendeu o recado, deixando o corredor de vez.

Luke estava imóvel. Se perguntando o que acabara de acontecer. Antes que pudesse retomar seu assunto, Arabella continuou o drama.

— Viu só o que você fez? Separar dois amigos assim...  - balançou a cabeça em reprovação, o olhando dos pés a cabeça. — Desumano.

— Sabe, - ele começou. — eu poderia te dedurar pro diretor, mas não vou fazer isso.

Arabella se surpreendeu. Quase abrindo um sorriso maléfico ao pensar que seu plano, que consistia em ser uma coitada, havia funcionado, até que o filho de Abutre continuou.

— A menos que... - ela revirou os olhos. — Bom, eu ainda não pensei nisso. Mas garanto que ficará bem guardado nessa câmera até que eu tenha um pedido para fazer.

— Chantagem é crime, sabia disso?

— Invasão é crime, sabia disso? - ele retrucou, dando meia volta.

Desapareceu ao virar o corredor e assim, Arabella se viu sozinha. Sem os livros, sem Nikolaj, e sem uma câmera quebrada.

Aquilo estava errado, e ela não deixaria nada como estava.

NOTAS DA AUTORA.

acredito que já tenha avisado nas notas iniciais, mas cá estou eu novamente! dividi esse capítulo em duas partes e pá pq além de estar mais longo do que o que eu esperava, eu tava ansiosa demais pra publicar, e uma mente ansiosa não funciona direito!
o próximo também não vai ser curto, mas vou me esforçar pra trazer o melhor!!

"o máximo que ela pode dizer é um não" a arabella macetando o jonas cara de mirtilo

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