𝟭𝟰. 𝗙𝗔𝗟𝗟𝗜𝗡𝗚

Màu nền
Font chữ
Font size
Chiều cao dòng




Alerta de gatilho: Abuso sexual, abuso psicológico e físico.





Gwyn descobriu que não era muito sensato dar vários goles em bebidas alcólicas. Aquelas goladas exageradas que havia dado no espumante, a deixaram mais fora da órbita do que o normal.

Ela até aceitou dançar com Nestha, Cassian e Emerie em um momento. E naquele momento ela nunca tinha se sentido tão... livre. Por mais, que a maneira como Nestha e Cassian dançavam não era nem um pouco convencional.

Sua melhor amiga era muito boa dançando, devido os anos de prática. Mas o jeito que ela dançava com o parceiro não se parecia nada com a valsa romântica que a Archeron tinha descrito para ela uma certa vez. Ao invés disso, Nestha balançava os quadris de um lado para o outro em um ritmo sensual, enquanto Cassian passava as mãos grandes pelos quadris da esposa, passeando o nariz pela curva do seu pescoço.

Ela deveria se sentir desconfortável em ver algo que parecia tão íntimo, certo? Mas, aquilo não a incomodou nem um pouco, e na verdade só a fez perceber que aqueles dois eram um dos casais mais lindos que ela já havia visto em sua vida.

Morrigan e Emerie também dançavam juntas, e quando Mor notou que Gwyn parecia meio deslocada, ela caminhou em sua direção, a pegando pela mão e ajudando a experimentar alguns movimentos diferentes.

No começo, a sacerdotisa não tinha se soltado completamente. Mas, depois de alguns minutos, ela deixou a música guiar seus movimentos, deixou que aquela sensação de liberdade fluísse por ela e pelo seu corpo. Não foi difícil acompanhar os passos que Morrigan havia a ensinado, nem sentiu suas bochechas ficarem vermelha quando se atreveu a mexer o quadril naquele ritmo mais sensual que nunca tinha nem sequer se ousado a ouvir.

E quando estava ali, aérea da realidade, ela sentiu novamente aquela queimação em suas costas, como se um par de olhos estivessem a incendiando.

Gwyn olhou para atrás pelo ombro, encontrando aqueles olhos que ela passou a conhecer muito bem. Azriel a encarava com tanta lascívia, que a sacerdotisa sentiu o corpo estremecer apenas com aquele olhar.

Ela ainda sentia o calor dos lábios do Encantador contra os do dela, ainda sentia a respiração contra o seu pescoço, e ainda conseguia escutar aquela voz rouca e grave em seu ouvido.

Ele tinha muito poder sobre ela, isso estava claro como o sol de manhã.

Mas, uma coisa que havia percebido é que, ela também tinha poder sobre o encantador. Não sabia, como, nem porquê, um macho como ele, com a possibilidade de ter qualquer fêmea aos seus pés, de alguma forma se sentia atraído por ela.

E Deuses... Como ela queria ter coragem o suficiente para usar esse poder que tinha contra o encantador da maneira que ele usava contra ela.

Nunca quis tanto ter a confiança que as mocinhas que lia nos livros tinham, nunca quis tanto ter confiança o suficiente para caminhar até o Mestre-Espião e dizer todas as coisas que passavam pela sua mente quando ele a olhava daquele jeito.

Mas naquela noite, ela sentiu que podia pelo menos tentar. E foi isso que fez, quando sustentou os olhos em Azriel e continuou dançando, passando a mão pelo corpo e rebolando o quadril avantajado que Nestha e Emerie diziam que ela tinha.

Um sorriso de lado surgiu no rosto do encantador. Azriel se ajeitou no sofá, abrindo um pouco mais as pernas, a língua passando pela bochecha interna como se segurasse e se contesse para não levantar.

Quando acordou na manhã seguinte, com a cabeça latejando de leve, ela pediu para a Mãe que a levasse logo. Não fazia a menor ideia de onde tinha tirado coragem para fazer tudo que tinha feito na noite passada.

E Caldeirão, ela tinha realmente beijado Azriel. Bom, não ainda da maneira que deveria ou gostaria, mas por tempo o suficiente para tirá-la completamente do chão e praticamente jogá-la em direção as estrelas.

Por mais que aquela ansiedade e aquela insegurança sempre a nocauteasse quando pensava em viver algo íntimo, Gwyn não podia negar que queria mais.

Não apenas queria, como precisava de Azriel.

E aquela sensação nova e estranha, tanto a assustava quanto a intrigava.

Gwyneth não viu o encantador de manhã, quem tinha a levado para Refúgio do Vento foi Cassian que tinha a explicado que Azriel precisou cuidar de uns assuntos com Rhysand e iria para Illyria mais tarde.

Parte dela agradeceu por isso, assim teria tempo de descansar a mente para não agir de maneira totalmente idiota quando estivesse perto do Encantador.

Quando chegou no acampamento, Emerie foi a primeira a ir em sua direção, dizendo que não poderia ir para o ringue hoje por conta de um problema com as encomendas da loja. Gwyn tranquilizou a amiga, dizendo que não havia problema.

Apesar de que, não sabia lidar com o fato de que seria a primeira vez que estaria "sozinha" ali. Seus pulmões pareciam carregar o peso de mil pedras. Tirou alguns segundos para fazer a respiração das Valquírias e se acalmar, caminhando em direção ao ringue logo depois.

Então, Gwyneth acabou treinando as illyrianas sozinha naquele dia. Pensou que seria mais difícil, mas teve a brilhante ideia de separar as fêmeas em pequenos grupos, fazendo com que elas trabalhassem em conjunto, o que facilitou muito.

O treino ainda estava bem no início, então não era nada complexo demais. estavam aprendendo sobre equilíbrio e controle da respiração.

— Muito bom, Sera. — Gwyn sorriu para uma das mais novas ali, provavelmente na idade dos 19 anos. — Continue na posição, depois troque de perna.

— É um pouco difícil com as asas. — Sera sorriu triste, obedecendo a valquíria. Teve uma certa dificuldade para trocar de perna. — Elas deviam ajudar no equilíbrio, mas quebradas acabam dificultando.

Gwyn sentiu uma pontada de dor no estômago ao escutar o testemunho de Sera alguns dias atrás. A garota tinha contado o que havia acontecido com o queixo erguido e sem gaguejar nenhuma vez.

Seu pai havia fechado a porta em suas asas, as quebrando e a impedindo de ver um curandeiro, fazendo com que os ossos se adaptassem novamente da maneira errada. Tudo isso porque ela havia se negado a fazer as tarefas domésticas naquele dia.

Seu irmão no entanto, havia a ajudado, visitando uma curandeira escondido para conseguir tônicos para a dor.

Sera disse que queria estudar para se tornar curandeira, e que queria lutar para nunca mais passar por aquilo de novo.

E aquilo... Gwyn conseguia entender completamente.

A illyriana era extremamente forte e madura para a sua idade, e não deixava o que tinha lhe acontecido a derrubar, pois estava sempre sorridente e animada nos treinos.

— Muito bem, meninas. — Gwyn bateu palmas para chamar atenção das illyrianas. — Por hoje é só, espero vocês amanhã no mesmo horário.

As fêmeas se dispersaram, conversando sobre o treino umas com as outras, descendo do ringue. Quando foi a vez de Gwyn descer, ela observou Balthazar se aproximar.

A sacerdotisa acenou, tentando não sentir aquele desconforto que sentia perto de qualquer outro macho que não fosse Azriel e Cassian. Precisou repetir em sua cabeça mil vezes, que Balthazar não a faria mal.

— Oi, Gwyneth. — O macho sorriu simpaticamente. — Está sozinha hoje?

— Emerie teve um problema com as encomendas hoje. — Gwyn ajeitou o traje no corpo. — Precisei fazer um treino mais calmo, por conta disso.

— Elas pareceram gostar. — O illyriano deu um leve sorriso, tirou um papel do bolso, estendendo para a sacerdotisa. — Este é o local onde a resistência costuma se encontrar.

O macho abaixou o tom de voz, Gwyn apenas concordou com a cabeça, pegando o papel e o guardando rapidamente.

— Sei que trabalha junto com o Mestre-Espião, se quiser levá-lo... — disse Balthazar. — O acampamento está meio agitado hoje, estamos desconfiados de que estejam planejando algo.

— Irei informar á ele. — A valquíria sorriu de leve. — Caso descobrir qualquer outra coisa, me avise.

— Claro. 

Gwyn estava prestes a agradecer o amigo de Emerie, mas paralisou ao escutar:

— Virou macho de repente e decidiu tomar coragem o suficiente para mexer com a vadia do Mestre-Espião, Balthazar?

— Subestimamos você, Balthazar.

Gwyneth virou o rosto na direção dos machos. O medo em seu corpo pareceu esvaziar, agora uma raiva latente tomava conta de suas veias e queimava seu corpo.

— Perdão? — respondeu.

Os machos illyrianos pararam de caminhar, voltando o olhar para onde a sacerdotisa e Balthazar se encontravam.

— Não dê ouvido a eles. — O amigo de Emerie a encarou. — Não vale a pena.

— Além de dissimulada é surda, fêmea? — Um deles caminhou até os dois.

O outro seguiu em silêncio, tentando caminhar com uma postura intimidadora, mas Gwyneth achou apenas ridículo.

— Acha que pode se referir a mim dessa maneira? — A valquíria reuniu toda coragem em seu corpo para respondê-lo.

O macho em sua frente riu com escárnio, torcendo os lábios em uma careta, enquanto a olhava de cima para baixo, dando um passo em sua direção.

Gwyn não recuou.

— Acha que ligo como devo me referir á você? — O illyriano cruzou os braços. — Acha que te reconheço como algo, além de vadia daquele bastardo?

— Já chega disso, Cézar. — Balthazar deu um passo para frente.

Gwyn cerrou os olhos, mas o macho olhou para ela novamente, um sorriso perverso surgindo em seu rosto feio e patético.

— Se bem que ele até que escolheu bem... — Ele a olhou de cima a baixo, de novo. Gwyn sentiu ânsia de vômito. — Mas talvez, ele poderia ter escolhido algo mais novo, mas suponho que o Encantador esteja familiarizado com coisas usadas e sujas.

A sacerdotisa recuou um passo, sem acreditar no que tinha escutado. Seus olhos ficaram perdidos, e ela sentiu o ardor querer queimar as suas orbes. Como ele poderia saber sobre isso?

— Ficou maluco? — Balthazar elevou o tom de voz.

— Quem sabe não podemos te ajudar a ficar novinha em folha? Talvez assim aquele cão faça melhor proveito.

Ele tentou tocá-la, mas Gwyneth desviou, a respiração começando a acelerar.

— Não toque em mim.

— Basta. — Balthazar deu um passo para frente, olhando para Cézar

Mas o macho riu, empurrando o amigo de Emerie para o chão, tentando chegar na sacerdotisa de novo.

Gwyn fechou seus sentidos, e não escutou mais nada quando mirou a bota nas partes baixas do sujeito ordinário, chutando com toda força que havia no seu âmago. O macho illyriano se inclinou com a dor, grunhindo enquanto segurava a calça.

A sacerdotisa aproveitou que ele tinha se encolhido e atacou em direção ao seu braço, o rodando para trás de suas costas, forçando seu tronco ainda mais para baixo, posicionou seu corpo ao lado e levou seu joelho em direção ao rosto do cretino, o chutando uma, duas, três vezes. Até que sentisse uma dor latejante em seu joelho, mas isso não a fez parar.

Nunca esteve tão cega de ódio. Nunca quis tanto rodar o pescoço de alguém igual quis fazer com aquele idiota.

Gwyn tirou a adaga de sua coxa, levantando o rosto sangrento do illyriano. Ele tentou revidar, tentou usar suas mãos, mas ela desviou, acertando uma cotovelada em sua têmpora e alguns socos em seu rosto. O illyriano grunhiu, pegando em seu braço e a colocando contra seu corpo.

— Não toque em mim. — Ela gritou afobada. A valquíria bateu a parte de trás da cabeça contra o rosto do macho com toda força que restava em seu ser.

Ele a soltou em resposta, reclamando de dor. O macho tentou alcança-la de novo, mas a sacerdotisa chutou seu peito com força, passando o pé em suas canelas, fazendo com que ele caísse no chão.

Gwyn apontou a adaga em sua garganta. A respiração ofegante, enquanto tremia com a adrenalina.

— Eu disse para não tocar em mim. — gritou entredentes, guardando a adaga novamente.

O macho grunhiu, tentou se levantar de novo, mas a valquíria chutou seu rosto caído, o impedindo.

Ela não escutou mais nada, enquanto destinava aquela raiva naquele rosto imundo.

Não sentiu mais nada.

Nunca mais.

Nunca mais.

Nunca mais.

Foi o que repetiu mentalmente enquanto aquela raiva, aquele ódio, passava pelo seu corpo como um fogo primitivo. Gwyneth sentiu seu corpo esquentar, suas mãos formigarem como se centenas de estrelas se acumulassem ali na sua mão.

Sentiu um par de mãos em seu ombro, mas desviou assustada.

— Não me toque!

— Gwyneth... — A voz de Balthazar tomou seus ouvidos.

Não enxergava ele, tudo que enxergava era um macho. Outro que poderia fazer algo contra ela. Um macho que poderia se aproveitar dela igual aqueles em Sangravah.

Foi quando percebeu que grande parte das pessoas no ringue a olhavam. Ela recuou um passo, depois outro, enquanto engolia em seco, os olhos azuis começando a lacrimejar.

— Me deixe te ajudar. — Gwyn recuou outro passo quando o illyriano chegou mais perto.

— Não me toque.

A sacerdotisa engoliu em seco, saindo dali apressadamente. Correu até chegar no chalé antigo do Grão-Senhor, o corpo latejando com as dores que agora se faziam presente, depois da adrenalina passar.

Ela adentrou na casa, tentando controlar a dor no peito devido a respiração desgovernada, tentando buscar pelo fôlego que faltava. Se apoiou na bancada da cozinha, o corpo tremendo enquanto tentava sustentar, já que ameaçava cair.

Olhou para suas mãos, que agora inchavam, os nós de seus dedos tomando uma coloração roxa. A sacerdotisa abriu e fechou as mãos, gemendo. Uma dor alucinante tomando conta de seu joelho.

Quem sabe não podemos te ajudar a ficar novinha em folha?

A voz daquele macho invadiu seus ouvidos, ecoando em sua mente.

Não.

Nunca mais.

Nunca mais.

Gwyn sentiu a respiração falhar de novo. Não conseguia respirar, enquanto se apoiava ali naquele balcão. Suas mãos machucadas começaram a suar, seus pés ficaram dormentes, e o seu coração batia fortemente contra as paredes de seu peito.

Fechou os olhos, sentindo o corpo inteiro tremer. Estava tão tonta, que quando abriu os olhos novamente, pôde jurar que viu a cozinha rodar.

Há quanto tempo estava ali?

— Gwyn? — Escutou a voz de um macho alguns metros dali.

Não. Não. Não.

Seus olhos quase saltaram para fora, tentando se manter em pé. Ela escutou os passos vindo em sua direção, tentou alcançar a adaga em sua coxa, mas suas mãos tremiam tanto que simplesmente não conseguiu.

Quando o macho se fez presente naquele cômodo, ela se recuou contra o balcão. A mão descendo em direção a coxa onde a adaga estava.

— Fique longe de mim. — Gwyn conseguiu dizer pausadamente, enquanto buscava pelo fôlego.

— Gwyneth. — A voz preocupada soou familiar, os cabelos pareceram familiares, as feições também, por mais que estivesse levemente embaçada.

O macho deu mais um passo em sua direção.

— Não. Não chegue perto de mim. — apertou a mão dolorida e machucada contra a adaga. Seu corpo tremeu novamente.

— Gwyn, sou eu. — Aquela voz familiar a fez parar de apertar a adaga. — Sou eu... Azriel. Não vou te machucar.

Ele levantou as mãos, como se estivesse em rendição. A expressão do illyriano era de puro terror e desespero.

Gwyn o conhecia.

Conhecia aquelas mãos, aquela silhueta.

Azriel era seu amigo. Ela confiava em Azriel. Ela gostava de Azriel.

— Azriel... — Ela sussurrou.

— Sim, Gwyn. — Aquela voz calorosa e delicada surgiu novamente. — Sou eu... Sou eu. Estou aqui com você.

Azriel.

Azriel que havia a salvado. Azriel que havia a ajudado.

Seu amigo.

Ela deixou um choro de alívio escapar, o corpo colapsando logo depois, fazendo suas pernas cederem, mas antes que pudesse atingir o chão, sentiu ser envolvida em um abraço, escorregando até a superfície de madeira do piso.

— Estou aqui. Estou aqui. — Os braços fortes ajeitaram o seu corpo contra o peito forte. — Você está segura, Gwyn. Você está segura.

A voz de Azriel era baixa, enquanto ele balançava o corpo naquele chão de madeira, tentando acalmá-la. Sentiu toques fantasmas carinhosos em suas pernas, e antes de fechar os olhos, ela observou as sombras cobrirem o seu corpo como uma manta.

Usada e suja.

Usada e suja.

Usada e suja.

O choro que saiu de seus lábios foi alto e engasgado, arranhando as paredes de sua garganta, enquanto ela soluçava em busca de ar.

Azriel a apertou mais contra seu corpo.

— Você está segura. Sinto muito por não estar aqui antes, por não ter chegado mais cedo. Eu estou aqui agora.

A sacerdotisa escutou a voz vacilante, como se estivesse embargada.

Ela sentiu então, o cheiro familiar de névoa noturna e cedro, respirou fundo tentando absorver aquele cheiro em sua mente. E de alguma forma, seu coração se aquietou, sua respiração aos poucos voltava ao normal.

Shh... — Azriel sussurrou, com o queixo apoiado no topo de sua cabeça. — Estou aqui, Gwyn.

Não sabia dizer se estava cansada por conta da sua crise, pela luta, ou se seu cérebro estava ficando sem oxigênio devido a falta de ar, mas sentiu seus olhos ficarem cada vez mais pesados, sentiu seu corpo aos poucos relaxar.

— Não vou a lugar nenhum.

Foi a última coisa que escutou, antes de apagar.



𓆩*𓆪

Azriel nunca tinha se arrependido tanto de algo igual se arrependeu de não ter ido para Illyria com Gwyneth naquela manhã.

Não depois de ter chegado naquele chalé e vê-la tão desesperada, ao ponto de nem sequer reconhcê-lo, ao ponto de temê-lo.

Ele nunca foi um cara de derrubar muitas lágrimas, mas Deuses... A vontade de chorar que havia sentido quando Gwyn colapsou no chão e se engasgou no próprio choro, nem mesmo a Mãe conseguiria explicar.

O encantador a segurou firme contra o próprio corpo, balançando-a na tentativa de fazê-la parar de tremer. Não tinha ideia do que tinha acontecido, do que tinha feito Gwyneth ter uma crise tão forte.

Mas ele deveria ter imaginado que isso iria acontecer naquele lugar de merda, deveria ter imaginado que trazer Gwyn para cá era uma péssima ideia.

Azriel se amaldiçoou mentalmente, enquanto olhava para os nós dos dedos de Gwyn roxos e inchados. Alguém havia apanhado terrivelmente, e no meio daquela tristeza ele sentiu uma pontada de orgulho.

Carregou seu corpo adormecido com cuidado para o sofá. Quando a deitou no macio, se apressou para cobri-la com a manta que ela havia usado naquele dia que tinham sido atacados.

O encantador a encarou com uma dor atordoante no peito. Tirou o cabelo ruivo de seu rosto com delicadeza, colocando-o atrás de sua orelha pontuda.

— Gwyn? — A voz grossa de Cassian soou do lado de fora. — Gwyn? Você está aqui?

— Está. — Azriel respondeu, agora ouvindo os passos firmes do irmão.

— Azriel?

Cass se fez presente na sala, olhando com preocupação para o sofá que Gwyn agora dormia. Os olhos castanhos do irmão voltaram para Azriel.

— O que aconteceu, Cassian?

— Há quanto tempo chegou?

— Isso não importa, eu quero saber o que aconteceu. — Azriel cerrou os punhos, a respiração se tornando pesada. — Onde você estava? Por que não a ajudou?

— Ei, se acalma. — O General colocou a mão nos ombros do amigo, apertando de leve. — Acabei de voltar para o acampamento, fiquei sabendo tem pouco tempo. Vim procurar por Gwyn.

— O que fizeram com ela?

— Az, você precisa se acalmar. — Cassian procurou seu olhar, apertando o ombro do encantador novamente.

— Me conte o que você sabe. — travou o maxilar.

— Gwyn lutou com um illyriano, pelo que me contaram. — Cassian o soltou, cruzando os braços. — Balthazar me disse que a provocaram.

Mentira. Suas sombras sussurraram. 

Não precisou delas para saber que o irmão escondia algo, apenas pelo jeito que o encarava ele já sabia que Cassian estava mentindo.

Azriel respirou fundo, passando a mão pelos cabelos.

— Me diga toda a verdade, Cassian. O que fizeram com ela?

— Não acho que tem necessid...

— Cassian, estou falando sério. — O encantador engoliu em seco.

O General desviou o olhar, mordendo a bochecha interna e exalando um longo suspiro. Os olhos de Cassian passaram por Gwyn, depois voltaram para Azriel.

— Me conte, porra.

— Eu não sei tudo, Az. — O irmão negou com a cabeça, passando a mão no rosto, como se pensasse se devesse ou não falar. — Sei que a chamaram de... De vadia... Que insinuaram que ela era... Suja e usada e que poderiam deixá-la... Que poderiam deixá-la nova em folha.

Cassian demorou para completar as frases, como se repeti-las fosse doloroso. A voz grave e alta, em um tom tão baixo que o encantador quase não foi capaz de escutar.

Quase. Pois havia entendido perfeitamente

— Um deles tentou tocá-la, acho que foi isso que ocasionou... Todo o resto.

Tentou tocá-la.

Pela Mãe... Como ele queria não ter entendido.

Os sentidos de Azriel desligaram, tudo que tinha em sua mente eram aquelas palavras, ecoando na parte mais sombria de seu ser. Ele cerrou os punhos, sentindo aquela raiva já familiar fluir pelas suas veias, fervendo todo o seu sangue.

Seu peito agora subia e descia em uma velocidade anormal.

— Az...

— Vou matá-los. — Foi tudo que ele respondeu. — Vou esfolá-los vivos e depois vou matá-los. Vou cortar a porra da mão e vou fazê-lo engolir.

Suas sombras deslizaram pelas suas mãos como se desejassem aquele sangue.

Ele caminhou em direção a porta, mas Cassian o segurou, impedindo-o.

— Azriel, se acalme.

Ao inferno que vou me acalmar. — Se soltou do irmão, o olhando indignado. — Você não escutou o que acabou de me dizer?

—Ei, escuta... Gwyn já deu um jeito nele. — Seu irmão o encarou com o semblante agora menos sério e mais amigável. — Praticamente acabou com o rosto do animal.

— Me diga o nome dele. — Azriel pediu entredentes. — Sei que você sabe.

Cassian o encarou, como se pudesse enxergar algo além do que já via, como se o estudasse profundamente. O irmão recuou um passou, o olhando como se o compreendesse.

— Cézar.

Azriel guardou aquele nome em sua memória, se obrigando a nunca esquecê-lo, se obrigando a deixá-lo marcado com a tinta mais vermelha em sua lista mental.

Só não o jurou de morte, pois se algum dia ele voltasse a se atrever a dizer algo, seria Gwyneth quem rodaria a lâmina no seu pescoço, e ele limparia o sangue das mãos dela com prazer.

— Vou levá-la de volta para a Casa. — Foi tudo que o encantador disse para o irmão. — Não acho que ela vai acordar por agora, e não a deixarei nesse lugar mais nenhum minuto.

Cassian concordou, voltando a cruzar os braços.

— Você não passou pelo acampamento antes? — perguntou o General. — Não viu o tumulto?

— Não. — O Mestre-Espião, caminhou até o sofá. — Vim direto para cá.

— Como sabia que Gwyneth estava aqui? 

Azriel pegou a sacerdotisa com delicadeza, a ajeitando em seus braços devagar. Sentindo o sangue gelar com a pergunta.

Como ele sabia que Gwyn estava ali?

— Não sabia. — voltou os olhos pro irmão. — Só resolvi passar aqui primeiro.

— Por quê? — Cassian franziu o cenho.

— Que tipo de perguntas são essas?

— Apenas perguntas. — O melhor amigo deu de ombros, o cenho levemente franzido. — Fique com ela pela tarde, irei avisar Emerie do ocorrido.

O encantador acenou com a cabeça, acumulando seu poder para atravessar. Tentou não pensar nas perguntas de Cassian quando caiu na varanda da Casa do Vento, com o corpo adormecido de Gwyneth em seus braços.

Tentou não pensar naquele sentimento de que algo estava errado antes mesmo de descobrir que estava.

Ao invés disso, apenas adentrou em Casa, levando Gwyn para o quarto e rezando para todos os Deuses existentes que o ocorrido não tirasse aquela confiança admirável que ela estava conquistando aos poucos naquele ano, que aquele macho inútil e repugnante não conseguisse apagar o brilho que Gwyn havia aprendido a usar e vestir magistralmente.

Ele não sabia o que faria se isso acontecesse.



𓆩*𓆪


Azriel não percebeu quando tinha dormido. A última coisa que se lembrava era que tinha colocado uma poltrona ali do lado da cama de Gwyn, imaginando que ela provavelmente acordaria assustada em um lugar diferente, e não achou que deixar que ela acordasse sozinha fosse sensato.

Então, se sentou ali na poltrona ao seu lado e se forçou a ler alguns relatórios que suas sombras tinham lhe trazido, forçando para pensar nas movimentações dos soldados de Beron para Adriata, nos símbolos daquele livro que Gwyn havia traduzido e nas Valquírias que possivelmente estavam vivas.

Rhysand iria contatar Helion para aquela tarefa em específico, e deixou que Lucien investigasse a situação, já que agora aparentemente ele possuía o mesmo poder que o pai.

Ele se forçou, mas não conseguiu "trabalhar" propriamente, porque toda vez desviava os olhos para checar se Gwyneth estava bem, toda vez seus pensamentos voavam para longe daqueles relatórios e pairavam na sacerdotisa.

Quando acordou, Gwyn ainda dormia. O encantador esticou as asas e o corpo, olhando para o relógio na parede, que marcava sete horas da noite.

Ele suspirou, se levantando e observando a valquíria. Gwyneth se remexeu na cama, fazendo com que ele entrasse em alerta. Ela mexeu novamente, dessa vez sua expressão contorcida em uma careta de dor. Gwyn soltou um resmungo dolorido que fez Azriel se sentar na cama e encostar em seus braços.

Os punhos dela estavam fechados com tanta força que o encantador jurou que as unhas dela a machucariam.

— Gwyn, acorde. — Sua voz saiu firme, porém suave ao mesmo tempo. — Gwyn.

A sacerdotisa abriu os olhos assustados, levantando o tronco em um supetão. Ela rastejou encolhida, abraçando os lençóis, enquanto olhava assustada para todos os cantos do quarto.

— Foi um pesadelo, você está bem, Gwyn. — Azriel colocou as mãos no colchão. . — Está segura aqui.

Os olhos espantados pararam nele. O corpo da sacerdotisa relaxou, e ela respirou fundo, fechando os olhos.

— Foi só um pesadelo.

— Você está aqui. — Sua respiração desgovernada aos poucos se acalmou.

Azriel apenas afirmou com a cabeça.

— Estou aqui, Gwyn. — Ele se sentou mais perto dela. A sacerdotisa engoliu em seco, deixando um suspiro pesado e aliviado sair de seus lábios. — Está melhor?

Ela afirmou, levando a mão até a testa suada.

— Há quanto tempo estou dormindo?

— Algumas horas... — respondeu, notando que ela ainda estava atordoada. — Está tudo bem agora, Gwyn. Foi só um sonho.

— O problema... O problema é que o sonho foi real. — Ela gaguejou respirando. — E fazia algumas noites que eu não sonhava com tudo que aconteceu, fazia algumas noites que eu estava dormindo bem.

A valquíria negou com a cabeça, como se estivesse indignada. Ela abraçou os próprios joelhos e Azriel quis abraçá-la, mas preferiu não tocar nela para não ativar mais nenhuma memória.

— Já faz dois anos e eu continuo... Continuo revivendo aquela noite. Continuo vendo aqueles machos deceparem a cabeça da minha irmã e me... e me...

— Acabou agora, Gwyn. — Azriel se apressou a dizer, antes que ela pudesse completar a frase.

— Mas não acabou, Azriel. — A voz de Gwyneth vacilou, começando a embargar. — Sempre terá algo que me fará lembrar, sempre terá alguém para me lembrar o quanto sou... O quanto sou suja e usada, e o quanto eu continuo não merecendo usar aquela pedra na minha testa.

— Não diga isso. — O encantador segurou sua mão firmemente. — Nunca mais diga isso, Gwyneth. Isso não é culpa sua.

— É minha culpa. — A sacerdotisa engoliu o choro. — Eu causei a morte de Catrin. Eu permiti que aqueles machos me violentassem. Fui teimosa e orgulhosa, me neguei a falar sobre as crianças, me neguei a falar qualquer coisa... Eu sou uma vergonha.

Ela disparou todas aquelas palavras como um arqueiro ao ataque. Seus olhos fecharam, e ela balançou o próprio corpo, tentando engolir o choro. Azriel não raciocinou, apenas puxou Gwyneth para seus braços, a envolvendo em seu abraço.

A valquíria se encolheu em sua direção, tentando controlar os soluços que escapavam de sua boca. Deuses... Como ele queria quebrar o pescoço daquele cretino que estimulou todo aquela dor que Gwyn sentia agora.

Ele a abraçou mais fortemente, e Gwyneth respondeu, o abraçando de volta, o rosto escondido em seu peito. O encantador sentiu o corpo da garota parar de tremer aos poucos, Gwyn respirou fundo, como se o cheirasse.

Azriel engoliu em seco, suspirando. Soltou Gwyn devagar, se afastando um pouco para olhá-la nos olhos.

— Eu cresci enjaulado até os meus 11 anos... — Ele tomou coragem para dizer. Gwyn o olhou, tirando a cabeça de seu peito. — Minha mãe trabalhava na casa de um lorde illyriano muito conhecido. Ele abusava diariamente dela...

Azriel respirou fundo novamente, tentando continuar.

— Fisicamente, mentalmente... Sexualmente. — Gwyn não tirou os olhos dos dele, mas Azriel precisou desviar o olhar para a parede, tentando conseguir forças para continuar. — Sou fruto disso, de todo esse abuso que minha mãe sofreu.

O encantador sentiu as sombras se esgueirarem entre seus braços, como se o incentivasse a continuar.

— O cretino não queria que as pessoas soubessem que ele tinha um filho bastardo. — Riu sem humor. — E sua mulher e filhos sentiam vergonha e ódio de mim de uma maneira descomunal, então me trancaram em uma cela no porão.

Gwyneth deixou um suspiro em choque sair de seus lábios.

— Todos os dias, algum deles descia para me lembrar que eu era uma aberração, que eu era indigno, que eu não devia ter nascido, que eu era um erro hediondo e que eu merecia aquilo. — Azriel fechou os olhos por uns segundos. Os flashes dos acontecimentos passando pela sua cabeça. — Me negavam comida, roupas limpas, água. Eu era uma criança e torcia para morrer todos os dias.

Ele olhou para Gwyn, que tinha os olhos contorcidos na mais pura careta de dor.

— Foi quando elas apareceram. — Ele indicou  as sombras em um aceno de cabeça, e elas passearam entre seus ombros. — No começo, não sabia o que fazer, o que significava, mas com o tempo, comecei a aprender a linguagem delas, e por muito tempo elas foram as minhas melhores amigas. Sempre me avisando quando um deles apareciam para me atormentar. Quando estava na hora de ver minha mãe.

Ele sentiu uma de suas sombras rodarem em seu cabelo, como se o acariciasse, e aquilo o fez reprimir um sorriso de agradecimento.

— Quando fiz oito anos, os filhos do lorde decidiram me testar para ver o que aconteceria se misturassem oléo, fogo e a cura rápida dos illyrianos.

Os olhos de Gwyneth saltaram, e ele desviou o olhar, envergonhado.

— Gritei tanto que acabaram me achando, mas não a tempo o suficiente para salvar as minhas mãos. — Ele engoliu em seco. — Por isso, elas são horríveis hoje.

Gwyneth negou com a cabeça, ainda atordoada com o que havia escutado.

— Azriel...

— Não precisa dizer nada. — interrompeu, um sorriso triste no rosto. — Apenas te contei isso para mostrar que somos dois sobreviventes, e que estamos aqui hoje, vivos, apesar de tudo. Para te mostrar que nunca passei pelo o que você passou, mas que te entendo e que estou aqui.

Os olhos de Gwyn lacrimejaram, deixando uma lágrima solitária cair de seu rosto. Azriel passou o dedo em sua bochecha, limpando-a, mas antes que pudesse retirar a mão, a sacerdotisa a segurou. A luva que deixava seus dedos amostra raspando em sua pele leitosa.

— Elas não são horríveis. — Gwyn sussurrou. — Você pode me mostrar.

— O- O quê? — Ele engasgou em surpresa.

— Me deixe ver suas mãos, Azriel. — Gwyn pediu, uma voz doce e calma que bagunçou todos os seus sentimentos.

O encantador deixou escapar o fôlego. Seu coração agora batia descontroladamente contra o peito, a ansiedade tomando conta de seu corpo. Mesmo assim, não conseguiu entender quando acenou com a cabeça positivamente.

Ele nunca ficava sem luvas perto de ninguém, raramente perto de seus irmãos, mas só. Mais ninguém.

Gwyn dedilhou sua mão direita, puxando delicadamente o couro em sua mão. Azriel sentiu a brisa fria que vinha da janela bater contra a palma, o que fez ele recuar e cerrar os punhos. Mas Gwyneth segurou sua mão em um carinho acolhedor.

Azriel parou de respirar.

A sacerdotisa abriu de leve sua mão, fazendo um carinho suave por toda a extensão dela. Os olhos azuis fixos nas cicatrizes brancas, enquanto passava os dedos nas partes mais machucadas.

— Você é lindo, Azriel. — Ela levou os olhos até os dele. — Com todas as suas cicatrizes.

E em um movimento inesperado, que o Mestre-Espião nunca imaginou que aconteceria com ele em algum dia, Gwyneth levou sua mão até seus lábios, beijando a palma que ele sempre escondeu.

Algo pareceu derreter no seu peito, como se o calor que tivesse se aquietado ali tivesse esquentado todo o seu interior. Azriel levou os olhos de avelãs surpresos em direção a sacerdotisa, ainda chocado com seu gesto.

— Não precisa usar isso perto de mim. — Ela apertou sua mão. — Nunca mais.

Azriel ainda estava sem palavras, então apenas concordou, sem saber o que dizer. Ele quis beijá-la, quis abraçá-la e agradecer imensamente por ela ter surgido em sua vida, por dá-lo a honra de compartilhar momentos da vida dela com ele.

Encantador?

— Sim?

Ele saiu de seu transe, desviando os olhos das suas mãos unidas, sem nenhum tipo de tecido impedindo de sentir a pele dela.

— Pode ficar aqui comigo? Não quero ficar sozinha.

Outra pergunta que o pegou de surpresa. Não imaginou que Gwyneth o gostaria de ter por perto depois de ter passado tudo que passou naquele dia. Mas ao invés de questioná-la se tinha certeza, tudo que conseguiu dizer foi:

Sempre.

SÓ PANCADARIA, SOCO NA CARA, BOMBA NESSE CAPÍTULO EIN? Já peço desculpas e não me matem. Foi muito difícil escrever essa capítulo porque reconhecer e colocar a dor tanto do trauma da Gwyn quanto do trauma de Azriel, foi bem desafiador, então espero que tenham gostado, apesar de todo sofrimento. Eu to achando muito lindo como esses dois se ajudam e se apoiam sem nem perceber, de maneira tão natural. Ta sendo uma delícia escrever eles.

Já deixo avisado novamente, que essa é uma história de teor maduro. Que trata a história de duas pessoas que foram terrivelmente machucadas pela vida, e que não tem como não tratar isso na história de maneira leve, por mais que eu tente. Então fiquem atentes aos gatilhos, se te causa algum desconforto, pare a leitura, podem me chamar se precisar, estou aberta para escutar todes vocês!

É isso pessoal, se gostarem, já sabem, comentem e curtem bastante que isso me motiva muito e ajuda a história chegar a mais pessoas! (JÁ TEMOS  QUASE 10K DE VIEWS EM MENOS DE UM MÊS ISSO É SURREAL)

Muito obrigada pelo carinho de sempre, vejo vocês no próximo capítulo. <3

Ps: Desculpa qualquer errinho.

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen2U.Pro