Linha vazia

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Havia um tempo que... não sei bem. Mas eu gostava, sabe? E ouvindo isso agora me bate uma saudade...

Eu tinha uns 18, tinha recém-chegado ao Mato Grosso. Eu lembro que nesses dias, na pressa de conhecer a minha nova cidade, “cidade grande” se comparasse à anterior, eu saía de bicicleta às cinco da manhã. Pegava a Nilo Torres, descia, subia, descia, o frio, o medo de topar com algum carro súbito nas ruas ainda vazias, o friozinho, o Sol nascendo, despontando, o céu rosado, eu subindo e descendo.

As subidas eram difíceis. Eu suava, claro. A bicicleta não tinha marcha e eu suava nas subidas, descansava nas descidas. Nos ouvidos eu injetava Ennio Morricone, Cassia Eller. Lembro de Ney Matogrosso, de umas músicas soltas do Scalene que eu estava conhecendo, de Ana Carolina. Isso em 2015. Já fazem 3 anos.

Hoje tornei a ouvir um disco daquela época. Bate uma saudade, um negócio, não sei bem.

Eu tinha avó viva ainda, sabe? Na verdade, viemos para o Mato Grosso por causa dela. Fomos os últimos da família em Rondônia a vir para o Mato Grosso. Ela já não era a mulher forte de uns seis anos antes. Forte não... Mas só o corpo era fraco. Não à toa viemos de Rondônia por causa dela. A gente era como besouros em volta da luz. Esse disco não me lembra ela exatamente. Só me lembra do tempo em que ela ainda estava viva.

Havia manhãs em que ela, debilitada como estava, ia até a minha casa... Me chamava: “Julian! Ô, meu filho...” E eu, do quarto, ouvia o cadeado do portão tilintar. Já sabia que era ela. Era um tempo complicado, eu era uma pessoa difícil. Difícil de acessar, de entender. Era isolado, não tinha entusiasmo comigo mesmo. Ela entrava devagarinho, uma mão amparando o peito, e quando me via escorado no balcão de mármore sorria para mim. “Ué, eu trouxe um negócio pra você”. Poxa, como ela sorria...

Não sei bem, mas ela gostava de escrever, sabe? Tinha um caderno, uma espécie de diário. Não se sabe o paradeiro dele hoje. Nesse caderno ela dizia que sentia dores, que passava madrugadas em claro sob dores atrozes. E que quando sentia essas dores, orava. E quando me via, sorria. Talvez até sentindo as dores. Deixava sobre o balcão de mármore um caneco alaranjado e um potezinho de margarina. No caneco havia chá. No potezinho, biscoitos de polvilho. Era o meu café da manhã que ela mesma fazia e me deixava nas mãos vazias.

É nos momentos de ócio que lembro desses biscoitos estarem ainda quentes, do gosto da farofa dela, do sorriso rasgado dela. Que dores ela não escondia por trás dos sorrisos? Mas só me lembro dela rir, porque é disso que quero lembrar, entende? Um egoísmo pessoal que me sustenta quando a mente viaja lá para os tempos dela. O resto, as cirurgias, a debilitação, o velório, a casa vazia... acho que não quero lembrar, não. Ao menos por agora que estou longe e sarei.

Ela era tão cheia, tão cheia... Ela enchia a gente. É a memória que não quero perder. Nunca, nunca.

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